Empreender para transformar: mulheres na linha de frente no combate à mudança global do clima

Transição para uma economia de baixo carbono requer não apenas transformações tecnológicas e econômicas, mas também uma profunda mudança social que inclua e empodere todos os segmentos da sociedade

Após a COP30, realizada em novembro de 2025 em Belém (PA), o debate sobre clima ganhou novos contornos ao incorporar de uma maneira ainda mais robusta um ator decisivo para a transição sustentável: o empreendedorismo feminino.

Em um mundo cada vez mais impactado por eventos climáticos extremos, são as mulheres que têm transformado vulnerabilidade em inovação, renda e conservação ambiental. No Brasil, esse protagonismo dialoga diretamente com diretrizes globais, como o Plano de Ação de Gênero da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), que reconhece o empoderamento feminino como pilar de uma resposta climática mais justa e eficaz.

As mulheres estão na linha de frente das ações de resiliência climática em comunidades ao redor do mundo, liderando esforços em agricultura sustentável, gestão de recursos hídricos e resposta a desastres, mas frequentemente não têm acesso aos serviços financeiros necessários para ampliar suas contribuições. Segundo a ONU, em 2022, apenas 3% de toda a ajuda oficial ao desenvolvimento relacionada ao clima tinha objetivos ligados à igualdade de gênero.

Para a diretora de Administração e Finanças do Sebrae Nacional, Margarete Coelho, fortalecer o empreendedorismo feminino é uma estratégia climática essencial. “O Sebrae vem intensificando ações a partir do reconhecimento do papel crucial dos pequenos negócios, em especial das empresas lideradas por mulheres, na agenda climática”, afirma. Programas como o Sebrae Delas oferecem capacitação em gestão, finanças e inovação, com foco crescente em negócios de impacto socioambiental e práticas como economia circular, bioeconomia e energias renováveis.

Margarete Coelho, diretora de Administração e Finanças do Sebrae Nacional

O alinhamento com a agenda internacional também é explícito. O Sebrae é signatário da Carta das Mulheres na COP30, que defende uma transição justa e inclusiva, e participa de eventos preparatórios que colocam o empreendedorismo feminino no centro das discussões climáticas. A iniciativa dialoga com o Plano de Ação de Gênero da ONU, que prevê ampliar a participação das mulheres em políticas climáticas e facilitar seu acesso a financiamento e tecnologia.

Um dos maiores gargalos, no entanto, segue sendo o crédito. Apesar de estudos mostrarem que mulheres são, em média, mais adimplentes, elas ainda pagam juros mais altos e enfrentam exigências desproporcionais. Segundo Margarete, o Sebrae atua como orientador e articulador para mudar esse cenário. “Capacitamos as empreendedoras na elaboração de planos de negócio robustos, alinhados aos critérios de sustentabilidade exigidos pelas linhas de crédito verdes”, explica.

Plataformas e programas específicos já mostram resultados. O projeto Crescimento Sustentável, por exemplo, apoia empresas na obtenção de reconhecimento ESG. Em pouco mais de três meses, alcançou 10 mil usuários cadastrados, com quase 3.600 reconhecimentos iniciais e 23 Selos ESG concedidos – cerca de metade desses para negócios liderados por mulheres. Além disso, o Sebrae conecta empreendedoras a bancos e fundos de investimento de impacto, ampliando as chances de que o financiamento climático chegue, de fato, a quem impulsiona a economia verde.

Na prática, histórias concretas mostram como essa combinação de capacitação, crédito e território pode gerar impacto ambiental e social. Em Igarapé-Açu (PA), a engenheira agrônoma Luciana Athayde, vencedora do Prêmio Sebrae Mulher de Negócios, transformou uma área degradada em uma agrofloresta produtiva. No Sítio Agroecológico Tolú, 20 dos 26 hectares são reflorestados e preservados, enquanto os demais abrigam a produção de hortifrutis e a criação de galinhas caipiras. O negócio produz cerca de 35 toneladas de alimentos orgânicos por ano e inovou ao lançar o tepache de pitaya, bebida fermentada feita a partir da casca da fruta, reduzindo desperdícios e agregando valor à produção local.

Luciana também desenvolve compostagem de resíduos orgânicos urbanos e rurais, coletados em parceria com comerciantes locais, e atua como referência em educação ambiental para escolas e universidades. Durante a pandemia, com o apoio do Sebrae, o negócio investiu em vendas por delivery e, mais tarde, abriu uma loja física. Em 2024, o faturamento chegou a R$ 300 mil – prova de que trabalhar priorizando práticas sustentáveis também pode ser economicamente viável.

Outro exemplo vem de Santa Bárbara do Pará, na região metropolitana de Belém. Lá, as mulheres da Associação de Mulheres Artesãs da Colônia Chicano produzem biojoias e peças de cerâmica a partir de argila extraída de forma tradicional às margens do rio Tauá. Lideradas por Rose Mescouto, elas criam colares, brincos e esculturas inspirados na vegetação amazônica, como folhas de cacau, cupuaçu e caroços de açaí. A produção, que fica em 200 peças mensais, podendo dobrar em períodos de alta demanda, gera renda, preserva saberes locais e valoriza a sociobiodiversidade

A importância da inclusão durante a transição climática

Essas iniciativas ganham ainda mais relevância no contexto da COP30. A atuação do Sebrae durante o evento foi estratégica para promover um empreendedorismo mais diverso e inclusivo. A instituição pretende continuar dando visibilidade a negócios liderados por mulheres, povos indígenas e comunidades tradicionais, criando uma vitrine de soluções sustentáveis e fortalecendo cadeias de valor da bioeconomia amazônica. Mentorias, consultorias e acesso a mercados fazem parte do pacote, com o objetivo de inserir esses empreendimentos no debate e nas oportunidades globais.

“Nosso compromisso é amplificar as vozes de mulheres de diversos territórios e realidades, garantindo que esse universo plural esteja bem representado nas discussões climáticas globais”, diz Margarete. Ao conectar gênero, clima e pequenos negócios, o Sebrae reforça uma mensagem central da COP30: não há transição climática eficaz sem inclusão. 

Crédito da foto principal: Unplash/Land O'Lakes